domingo, 17 de abril de 2011

PÁPRICA


Ela abre os olhos e observa a meia luz que passa por entre as frestas da cortina, sem saber ao certo se está amanhecendo ou se é entardecer. Franze um pouco a testa quando começa a se lembrar da dura decisão que terá que tomar muito em breve. Mesmo assim, está satisfeita, pois experimentou a leveza da maior liberdade que alguém pode sentir: esquecer o próprio tempo. Abre as janelas e contempla as cores do céu límpido.

Olhar vazio.

Páprica
 
O céu estava alaranjado. Sentado em sua cadeira nos fundos de sua casa, como de costume, ele contemplou o jogo de cores celestes. Um pouco de azul, uma pitada de rosa, mas, em sua maioria, algo meio laranja. Concentrou-se tanto nisso que não se lembrava mais dos motivos que o levaram a divagar.
 
Respirou fundo. Sentiu a brisa. Fechou os olhos.
 
Páprica.
 
Ao mesmo tempo, ela abre a porta de sua casa depois de um dia de trabalho. Dois ônibus lotados durante o caminho feito em companhia de pessoas com todo tipo de aroma. De cheiro ocre a um exagero de baunilha. “Graças a Deus, cheguei!”. Poderia ser melhor, mas está em casa e é isso o que importa. 
 
Ela tranca a porta, já remoendo o dia que passou.
 
Páprica.
 
Longe dali, ainda sentindo o gosto de sua bebida, ele a olha penteando os cabelos, admirando o realce de sua pele clara face ao castanho escuro dos fios. Percebendo que está sendo observada, ela olha para trás com um sorriso faceiro e volta para cama. Ele a abraça e, sentindo o suave toque de seus seios nus contra sua barriga, beija-a pouco acima dos olhos e encosta carinhosamente o queixo sobre sua cabeça, olhando fixamente para o nada.
 
Observa, concentrado, a parede cor creme à sua frente, projetando de sua mente algumas cenas de sua vida.
 
Páprica.
 
Praticando caminhada (o único esporte em que era bom, mesmo alguns dizendo que ele andava de um jeito estranho), resolveu seguir por uma trilha diferente dessa vez, então... virou à esquerda por uma rua que nunca tinha ido. O ar frio entrava por suas narinas e lhe dava a sensação de lhe limpar por dentro. A cada expiração, uma sensação agradável. Mas como sempre acontece, em determinado momento, teve que voltar. Voltar pelo mesmo caminho de sempre. Voltar ao começo de tudo. Voltar sempre. 
 
Olhou aquele caminho levemente tortuoso. Sempre.
 
Páprica.
 
Permanecia olhando para o fogão há uns dez minutos como que se preparando para um desafio. Estava aprendendo a cozinhar. Tinha que aprender, oras. Separou todos os ingredientes, acendeu a chama, calculou exageradamente a quantidade de óleo a colocar na panela. Mexeu sempre, como aconselhado. Adicionou água até a altura determinada. Contou os minutos olhando para o relógio. O cheiro exalado indicava que estava no caminho certo. Aguardou pacientemente a hora de degustar. Aprendeu a ter paciência, que sempre lhe disseram ser fundamental. Estava pronto. Tudo estava dentro dos parâmetros: havia consistência, estrutura homogênea, superfície dourada, interior quente e úmido, como deveria ser. Mais um pouco e passava do ponto. Resolveu saborear. Insosso. Mas estava tão perto. Uma leve salpicada de algo que ainda não conhecia e a receita estará pronta. Falta apenas uma coisa.
 
Falta páprica.

BC

5 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Páprica não é um tipo de pimenta?

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  3. Significa "pimenta" em algumas línguas, mas aqui no Brasil é meio que "derivada" da pimenta... depois q determinada espécie de pimenta é seca e moída,vira páprica!
    xD


    Cadê o texto,brother?? E cadê vc,q sumiu?!

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  4. Gostei. Me contive para não perguntar "que raios de páprica?!" antes de terminar o texto. Valeu a pena esperar.

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  5. Ei, me desculpe pela pressa de hj, estava resolvendo alguns últimos preparativos das FÉRIAS!êeeehhh...me add aí em alguma "rede social", msn, sei lá, hahaha, carol mineirinha sempre...bj

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